A PRIMEIRA GUITARRA DE SIDNEY BRETANHA...

...segundo meu mano Arnóbio, não foi uma Fender Telecaster ou strato, nem Gibson Les Paul, nem Gianinni, Di Giorgio, Tonante, nenhuma marca existente em qualquer vitrine destas lojas especializadas no ramo musical. Um pedaço de “talba” qualquer, talvez um dormente da antiga ferrovia Mauá, que passava ali na beira dos campos de Dona Aldeide Bretanha, onde o Betinho (vulgo Sidney) passou sua infância. Sua “guita” chamaria Maibelline se aqui fosse o Mississipi e ele tivesse nascido Chuck Berry, talvez Lucille, que B.B. King salvou de um hotel incendiado em Chicago. Seria a mágica viola de 12 cordas do menestrel Basílio Conceição, nem o pinho enfeitado com adornos de prata do grande mestre Assis Botelho, de muitas milongas, rasqueados e contrapassos, animando fandangos, levantando a poeira nas bailantas de cola atada, ou, apenas fazendo um costado, pro velho minuano declamar sussurrando, assoviando entre as “talbas” de uma bolanta, e que algum dia poderão transformar-se na guitarra de algum guri. É!! Solitária bolanta perdida na pampa absoluta e a fumaça do fogão a lenha subindo aos céus noturnos, misturando-se ao rastro brilhante de estrelas... um tambo, chamado via-láctea, e que segundo Arnóbio, serviu de teto para um fugitivo da prisão de Fernando de Noronha, que veio de lá, dos trópicos se esconder aqui no Arroio Grande...um poeta chamado “Pedro Canga”, vulgo: O embuçado de Erval!! Enquanto isso o seu Omar (vulgo Valdoir) estava mergulhado no ritual preparativo de um arroz com galinha, ao qual tive a honra de ser convidado. Também me confidenciou o Arnóbio, que o Bar do castelhano chapista, andava fechado, porque o nosso bom Luis Alberto (vulgo castelhano chapista ou em estados alterados de consciência: Tiazinha) havia se passado no vinhozito branco e suave, que fica “mocozado”, sempre ali bem embaixo do balcão, enquanto atende sua clientela fidedigna, com a maior simpatia e educação que lhe são peculiares, e sendo assim, Eu, o Sidney e o Arnóbio, como freqüentadores fidedignos (pelo menos nos achamos), estamos reféns daquelas portões azuis, de momento fechados, também conhecido como Bar da Rampa. E de repente, sentia-se o cheiro estimulante dos temperos fritando na panela de ferro, a espera da penosa... ai, ai, ai. Que diriam de mim meus amigos vegetarianos. O Arnóbio tira de sua prateleira de relíquias, um daqueles monóculos de slide, e pela primeira vez, pude testemunhar a beleza mística de uma mina lá nos anos 60... Aldeide!!! Vestindo um pala quadriculado (ou seria xadrez?) sua áurea naquela foto me transformou em um de seus potenciais namorados numa próxima encarnação, onde nos conheceremos na flor de nossas futuras vidas... quem sabe? Mas ali nos loucos anos 60, Betinho ainda estava viajando pelas galáxias de sua inexistência material, mas sua alma já rondava estes pagos, de carona com o minuano, que assoviava “My Way” em compasso de milonga. E ele como um violeiro inspirado, escolheu a dedo chegar nesse mundo através do ventre de sua mamãe, e herdou dela o dom mágico de lidar com as plantas, e no seu caso específico... o pinho... nave com a qual viaja no realismo fantástico dos personagens mitológicos que só existem aqui no A.Grande. Mas a cerveja havia acabado, e os compromissos com a vagabundagem me chamavam, e eu deixei a casa do Arnóbio sem provar o rango, que já estava quase no ponto, e: “-Saltei pra resteva!!” Embarquei no fusca e subi a coxilha, em busca da felicidade, algo de extrema complexidade, porque é um estado de espírito que só existe a partir de uma imensa simplicidade, quase uma impossibilidade para a maioria previsível da humanidade. Propositalmente fugi de meu surrealismo habitual, pra escrever tudo isso que o Arnóbio me contou, e é ele quem tinha o dever para com seus amigos, admiradores e leitores de ser o narrador, impecável e espirituoso. E porque todos sabem que ele é um “china veia”, tanto no mundo burlesco como no mundo formal das letras. Então sendo assim... deixa de ser “Mona” e volte para o nosso cabaré literário... maninha.

Edu Damatta (Caboclo) - Publicado em 17 de abril de 2009.


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